Espaço de sentir e pensar de Laércio Lopes de Araujo

segunda-feira, 18 de junho de 2018

Mendácio




Mendácio era um palhaço com uma história difícil de compreender. Nascera na funerária e o médico sem saber o que fazer, chamara o padre e não o coveiro.
Na hora de toda a atrapalhação, pensava-se em logo descartar-se daquela insólita figura que enganara o destino. Mas por obra do tinhoso, jogaram o bebê fora e entregaram para a mãe a placenta, que ela criou com carinho e muita rigidez.
Mendácio, que não esqueçamos é placenta, andava como Carlitos, na medida em que tinha uma espinha bífida oculta que o fazia andar 10 para as 2!
O pai, com muita imaginação dera-lhe o nome de batismo do goleiro reserva do Santos na época de Pelé. Mas como em sua vida, quase tudo era picaresco, nem para goleiro prestava.
Lembra sempre que para jogar bola no “recreio”, Mendácio precisava levar a bola. Sua tortura eram as aulas de Educação Física. Gordinho e desajeitado sempre ficava sem ser escolhido e o professor tinha que reforçar o time do qual fazia parte para que fosse aceito.
Descobriu muito mais tarde que sofrera bulling mas, já era muito tarde, o que restou foi um impulso gigantesco de superação que quanto mais o tornava ainda pior nos esportes o tornava um chato e pedante ainda melhor!
Leu a Enciclopédia Barsa toda, quando tinha algo como 10 a 12 anos. Palhaçada diziam, e mesmo assim foi incapaz de perceber o seu destino.
Então foi lendo, lendo, lendo e um dia seu pai vendo-o compenetrado com uma leitura que lhe parecia interessante e uma pilha de livros ao lado, comunicou sua impressão sobre o destino do filho: “não adianta ser um burro carregado de livros!”
Mendácio não percebera os vaticínios e os oráculos ditos da boca do genitor, e mesmo quando pego de surpresa, não percebera o quanto eram premonitórias as observações. Certo dia, impaciente com a prolixidade de Mendácio, o pai lhe reprovara e disse: ‘meu filho, para burro só te faltam penas!”
Mendácio foi rápido: “mas, burro não tem penas!”
Não lhe faltava nada então, como acertadamente objetara o pai. Foi então que de repente, nada mais que de repente, teve depois de quase 5 lustros uma epifania.
Nascera para ser palhaço. Palhaço como Lazarrillo, aquele de Tormes!
Perguntava-se sobre o nome que deveria tomar, nada lhe ocorrera, até que num relampejo de genialidade ou de burrice, surgira-lhe o nome de Mendácio, aquele que tudo que diz, sobre si e sobre o mundo é mentira, e quando afirma sem medo, tal verdade, está mentindo, assim como, nascido numa funerária, sua vida fora antes uma mentira, porque não nascera, mas antes morrera, e a placenta vai construindo uma história.

Tudo Mentira! A mais absoluta verdade!

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