Estava em Lucerna,
uma cidade bela, encravada nos cantões suíços. Era um escritor famoso, que
tinha uma obra discutível, mas que num mundo pós-moderno e ávido por misticismo
new age e auto-ajuda, transformara-se
num best-seller!
Sua obra traduzida
nas mais variadas línguas, era discutível do ponto de vista literário, mas seus
detratores não o haviam lido, e seu público atribuía a suas obras significados
os mais variados e contraditórios, como que a corroborar, que aquela obra não
se resumia ao que estava escrito no papel, mas que se construía na relação com
o leitor.
Poderíamos dizer que
era uma obra comercial, mas tal poderia apenas ser um preconceito que não se
confirmaria, a não ser na leitura acurada e sincera de uma obra com milhares de
leitores!
Enfim, laureado e
premiado, dizendo a todos que o ouvissem que apenas o Nobel era efetivamente um
prêmio que honraria uma obra literária, como forma de se auto-indicar, de se
autopromover, o escritor estava em Lucerna para autografar mais uma de suas
obras, que marcadas por uma espiritualidade superficial e difusa, conseguia
imediata repercussão!
Em sua juventude,
vivendo sob uma ditadura militar, de maldita herança caudilhesca legada pelos
nossos antepassados, tornando nossas Repúblicas nada republicanas, foi antes de
tudo um contestador embalado na canabis,
como forma de expressão do natural, daquilo que sendo natural não faz mal, mas
deixa o sujeito maluco beleza!
Mantém certos
sinais, que lhe remetem a um estilo Hippie tropicalizado, mas que sua busca de
aceitação pelo andar de cima, e pela elite literária são apenas atavismos para
tornar o produto mais curioso ao consumidor deste tipo de literatura!
Incansável em suas
incongruências, relata em entrevista, na Lucerna perdida na glória de sua obra,
que ao dar autógrafos, surge uma prostituta, bela, encantadora, que ao saber de
sua estada em Lucerna, e sendo-lhe conterrânea, desejava um autógrafo seu.
Não importa quem me
lê, até porque as pessoas hoje se resumem ao que fazem, e não ao que são como
existentes, mas esta redução não tem cheiro quando o que importa é vender, seja
o que se apresentar. A forma como apresentou o fato da prostituta em sua mesa
de autógrafos, traz embutido na metalinguagem o preconceito, que mesmo um
hippie tropicalizado não percebe de pronto.
Jocosamente descreve
a forma como ela o convida para uma noite de autógrafos no bordel onde
trabalhava a dita admiradora da obra! De inicio titubeia, procrastina, ancorado
nos argumentos de sempre, da falta de tempo, dos excessos de compromissos, da
agenda cheia. Preocupado até em sua singela demonstração de um preconceito incoerente com sua obra, pergunta a uma jornalista se não pegaria mal ir a um prostíbulo e lá ser identificado, ao que esta, num reforço, diz-lhe que se ele fosse o Papa até pegaria mal!
Mas como homem, não
fugindo à regra de que um dos sonhos masculinos é a conversão de uma prostituta
em mater santae, acaba por aceitar o
convite, e no dia que se apresenta na Casa de Mãe Joana, descreve que naquele
dia não houve expediente, que todas estavam com seus maridos e companheiros.
Ora, o escritor
espiritualista havia conseguido, no discurso único, em uma só entrevista,
realizar o sonho de todos os homens, a partir de sua literatura, tornou-as
todas santas mulheres, converteu-as todas em boas prostitutas, que em nome da
literatura, suspendem a venda de seu corpo, e mostram ao mundo que podem ser
boas mãe, mulheres e leitoras. Havia ele não convertido uma, mas muitas
prostitutas em mulheres respeitáveis.
Uma pena, porque com
certeza, queria-as mais prostitutas do que esposas, queria-as mais integradas
ao espaço mesmo de sua condição de mulher, que não se submete pacificamente à
condição de objeto masculino de uma sociedade hipócrita, mas exercendo naquele
momento, e em todos os momentos o exercício de uma identidade que lhes conferem
existência e dignidade humana!
A auto-ajuda, o new age, o politicamente correto é
assim, preconceituoso, escravizador e violentador de identidades,
desconstruidor da existência do outro enquanto outro!
Mas vai que ele
ganha o prêmio Nobel. Tenho de me apressar, pois que de repente, a morte que
ele afirma estar sempre a seu lado, resolve leva-lo antes que o Nobel saia, ou
ao contrário, que se retarde e ao ganhar o Nobel, terei ainda de ver na capa
dos livros, Premio Nobel de Literatura com o Livro X!
Eu hem! Queria é que
elas não tivessem se ausentado do trabalho, e talvez assim pudessem ser a
inspiração do mais belo romance, porque uma mulher que ama, é sempre uma puta
completa na cama! E cada homem quer da sua, exclusividade!