Espaço de sentir e pensar de Laércio Lopes de Araujo

sábado, 15 de setembro de 2012

O Bordel e o Escritor




Estava em Lucerna, uma cidade bela, encravada nos cantões suíços. Era um escritor famoso, que tinha uma obra discutível, mas que num mundo pós-moderno e ávido por misticismo new age e auto-ajuda, transformara-se num best-seller!
Sua obra traduzida nas mais variadas línguas, era discutível do ponto de vista literário, mas seus detratores não o haviam lido, e seu público atribuía a suas obras significados os mais variados e contraditórios, como que a corroborar, que aquela obra não se resumia ao que estava escrito no papel, mas que se construía na relação com o leitor.
Poderíamos dizer que era uma obra comercial, mas tal poderia apenas ser um preconceito que não se confirmaria, a não ser na leitura acurada e sincera de uma obra com milhares de leitores!
Enfim, laureado e premiado, dizendo a todos que o ouvissem que apenas o Nobel era efetivamente um prêmio que honraria uma obra literária, como forma de se auto-indicar, de se autopromover, o escritor estava em Lucerna para autografar mais uma de suas obras, que marcadas por uma espiritualidade superficial e difusa, conseguia imediata repercussão!
Em sua juventude, vivendo sob uma ditadura militar, de maldita herança caudilhesca legada pelos nossos antepassados, tornando nossas Repúblicas nada republicanas, foi antes de tudo um contestador embalado na canabis, como forma de expressão do natural, daquilo que sendo natural não faz mal, mas deixa o sujeito maluco beleza!
Mantém certos sinais, que lhe remetem a um estilo Hippie tropicalizado, mas que sua busca de aceitação pelo andar de cima, e pela elite literária são apenas atavismos para tornar o produto mais curioso ao consumidor deste tipo de literatura!
Incansável em suas incongruências, relata em entrevista, na Lucerna perdida na glória de sua obra, que ao dar autógrafos, surge uma prostituta, bela, encantadora, que ao saber de sua estada em Lucerna, e sendo-lhe conterrânea, desejava um autógrafo seu.
Não importa quem me lê, até porque as pessoas hoje se resumem ao que fazem, e não ao que são como existentes, mas esta redução não tem cheiro quando o que importa é vender, seja o que se apresentar. A forma como apresentou o fato da prostituta em sua mesa de autógrafos, traz embutido na metalinguagem o preconceito, que mesmo um hippie tropicalizado não percebe de pronto.
Jocosamente descreve a forma como ela o convida para uma noite de autógrafos no bordel onde trabalhava a dita admiradora da obra! De inicio titubeia, procrastina, ancorado nos argumentos de sempre, da falta de tempo, dos excessos de compromissos, da agenda cheia. Preocupado até em sua singela demonstração de um preconceito incoerente com sua obra, pergunta a uma jornalista se não pegaria mal ir a um prostíbulo e lá ser identificado, ao que esta, num reforço, diz-lhe que se ele fosse o Papa até pegaria mal!
Mas como homem, não fugindo à regra de que um dos sonhos masculinos é a conversão de uma prostituta em mater santae, acaba por aceitar o convite, e no dia que se apresenta na Casa de Mãe Joana, descreve que naquele dia não houve expediente, que todas estavam com seus maridos e companheiros.
Ora, o escritor espiritualista havia conseguido, no discurso único, em uma só entrevista, realizar o sonho de todos os homens, a partir de sua literatura, tornou-as todas santas mulheres, converteu-as todas em boas prostitutas, que em nome da literatura, suspendem a venda de seu corpo, e mostram ao mundo que podem ser boas mãe, mulheres e leitoras. Havia ele não convertido uma, mas muitas prostitutas em mulheres respeitáveis.
Uma pena, porque com certeza, queria-as mais prostitutas do que esposas, queria-as mais integradas ao espaço mesmo de sua condição de mulher, que não se submete pacificamente à condição de objeto masculino de uma sociedade hipócrita, mas exercendo naquele momento, e em todos os momentos o exercício de uma identidade que lhes conferem existência e dignidade humana!
A auto-ajuda, o new age, o politicamente correto é assim, preconceituoso, escravizador e violentador de identidades, desconstruidor da existência do outro enquanto outro!
Mas vai que ele ganha o prêmio Nobel. Tenho de me apressar, pois que de repente, a morte que ele afirma estar sempre a seu lado, resolve leva-lo antes que o Nobel saia, ou ao contrário, que se retarde e ao ganhar o Nobel, terei ainda de ver na capa dos livros, Premio Nobel de Literatura com o Livro X!
Eu hem! Queria é que elas não tivessem se ausentado do trabalho, e talvez assim pudessem ser a inspiração do mais belo romance, porque uma mulher que ama, é sempre uma puta completa na cama! E cada homem quer da sua, exclusividade!

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