Saí de uma sessão de
cinema, fiquei imensamente perturbado porque em toda a projeção não houvera uma
música, um som, que não aqueles decorrentes da própria cena, o diálogo entre os
personagens, a redução da compreensão ao mínimo que se oferece.
Perturbou-me o fato
de que a fé pudesse levar homens a seus limites, que crer na verdade escatológica
do advento pode ter mudado a existência de homens que voluntariamente se
colocaram em holocausto.
As imagens permanecem
na mente, e se repetem exaustivamente, num conjunto de ondas que vêm trazendo
novas interpretações e vão levando angústias que se desfazem sobre a areia como
bolhas no mar.
Silêncio! É um estado
beatífico que não conseguimos encontrar, que nos é negado nestas imensas
cidades onde nos aglomeramos e onde é impossível sentar consigo e ouvir nosso
coração contra a caixa torácica.
Escutamos, muito
raramente o pulsar da artéria temporal sobre o travesseiro, e nos assaltam as imagens
de batalhões de soldados de chumbo a marchar no interior do travesseiro para
batalhas onde, entre mortos e feridos, todos são salvos para que em outro dia,
em outro lugar, tudo possa se dar novamente.
E o silencio do filme
é perturbador, porque não o encontramos de maneira fácil, não nos é dado um
momento de repouso e de reflexão, não há como escapar das inúmeras experiências
dolorosas de ouvir aquilo que não queremos saber, compreender, participar.
As casas não são mais
silenciosas, a onipresença de aparelhos eletrônicos com seus imensos artifícios
de interação, para que não esqueçamos que a tecnologia move, contra nós, finas
teias de aprisionamento, não nos deixam silenciar, não nos deixam monologar com
nossos desejos e sofrimentos.
É doloroso não
conseguirmos ter momentos de beatífico silêncio na intimidade do outro, olhando
no fundo dos olhos, colados pele e pele, cheiros, gostos, intimidade. Como
ansiamos por momentos que dizem mais do que todas as palavras ditas ou escritas,
e como esses nos são negados.
Como precisamos do
silêncio para que a leitura se faça inteira, para que aquilo que jorra do papel
efetivamente encontre seu leito para o mais fundo de nós! Como precisamos do
silêncio para embarcar numa viagem ao mais fundo da alma daquele que existe
comigo, no espaço da cama que apenas sustenta nossos corpos, que apenas serve
de limite para um Universo imaginado, e que é todo o espaço desejado para o ato
de amar!
O silêncio é
verdadeira sublimidade e é sentido no ato e logo após o amar, e como é fugidio,
como é poderoso, como é capaz de resumir toda uma existência nas palavras não
ditas.
Saí da sessão de
cinema perturbado pelo silêncio durante toda a fita, mas o silêncio não saiu de
mim, permanece comigo, e cresce, sempre mais, devora-me as entranhas, altera
minha percepção de humanidade, faz-me desesperadamente desejar o silêncio, tão
mais próximo quanto mais desejado, do outro.
O silêncio é um
poderoso discurso que acentua a compreensão da incapacidade de nossos pulmões
de gritar ao mundo nossos sentimentos. O silêncio é o redentor que nos salva
dos infernos dantescos em que transformamos nossas cidades.
O silêncio é necessidade
imperiosa para que se permita um mínimo de sanidade num mundo completamente ensandecido
pelo ruído, pela máquina e pelo desatino do ter.
Silêncio!
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