Esta é uma pequena
estória, que aconteceu nos idos de 1775, um ano após a reinstauração do
Parlamento de Paris por Luis XVI. Qualquer semelhança com a realidade é mera
coincidência.
Todos sabemos que
durante o reinado de Luis XVI houve o escândalo do Colar, que envolve uma
antiga parenta da dinastia de Valois, o Cardeal de Rohan e a Rainha Maria
Antonieta.
O colar que na
verdade foi comprado pelo ministro Turgot para comprar os votos dos pares de
França para aprovar aumento de impostos, foi vendido lentamente, em partes e
seus recursos regiamente distribuídos entre os pares de França que deveriam
votar novas tungadas nos bolsos do povo francês!
Sabiamente o Cardeal
de Rohan que desejava assumir o posto de principal ministro do Rei, distribui
as prebendas, e tem um grande amigo, um advogado sombrio, que nunca conseguiu
passar em qualquer concurso para juiz, apesar de ter tentado, e nunca escreveu
qualquer linha de direito real que lhe fizesse admirar, mas que se lhe prestou prontamente para atuar como protetor, se por algum motivo fosse descoberto o esquema. Este nosso advogado
Armand Thomas de Mirmesonil, era muito subserviente, e muito ativo, apesar de
algo incapaz de exercer com brilho seu ofício.
Quando todos sabiam
que o escândalo do Colar, o mais espetacular de toda a França monárquica, havia desencadeado um onda de fervor e indignação popular, o
Cardeal de Rohan colocou, indicando os bons préstimos e a subserviência, a Armand Thomas como advogado geral do Reino, e
para entrar em contato com todos os envolvidos para tentar aplacar a fúria
popular e dos libelos.
Neste ínterim, Armand
Thomas conheceu uma jovem e destemida estudante de direito que servia de
defensora de um dos pares que haviam recebido suas parcelas ordinatórias, para
votar novas vantagens para a nobreza e impostos para o povo. Tratava-se da
inteligente Madame de Rangeaux.
Percebendo a
oportunidade de se tornar mais íntimo da Corte, ficou enamorado Armand Thomas de madame, o que permitiu a indicação do Rei, não só por ser
amigo de Rohan, por saber todos os fatos concernentes ao Colar, mas tão somente, e mais importante, ser íntimo da Corte e por namorar
Rangeaux. Foi assim, indicado para o Parlamento de Paris. Porém, como o cargo era
hereditário e deveria ser pago à Coroa, e estando Armand Thomas já envolvido
com processos por falta de dinheiro, ficou combinado que pagaria durante os
julgamentos, ou mesmo com estes.
Descoberto o
imbróglio de sua escolha, Armand Thomas não sabia se julgava o processo do
Colar, por obviamente impedido, ou se julgava, para então pagar a prebenda
recebida.
Restif de La Bretonne
assim relata a encruzilhada moral e judicial de nosso personagem estórico, em
diálogo com Madame de Rangeaux:
- Querido, você não
pode julgar o Escândalo do Colar, você é amigo do Rei, indicado pelo Rei,
advogado do corruptor dos pares, não tem o dinheiro necessário para pagar sua prebenda,
e ainda por cima, sabes de meu envolvimento no Escândalo, por favor seja
bonzinho, não julgue vai!
Responde Armand
Thomas:
- Mas sabes que devo
isso ao Rei, devo-lhe literalmente o cargo, devo-lhe as sinecuras e prebendas,
não posso desapontá-lo!
- Ah! Querido! Depois
que deixaste esta vasta barba, e que passou a projetar o seu maxilar para
frente, para parecer mais aristocrático, nunca mais fez minhas vontadinhas,
você sabe que a maioria dos ministros também foram escolhidos pelo Rei, o
Escândalo não dará em nada!
- Mas querida, minha
lealdade é incondicional, e favor tem que ser pago, custe o que custar!
- Querido, quantas
coisas já lhe contei por entre estes lençóis, até não disse que vivia contigo,
mas que era apenas sua madame, já lhe contei todos os segredos do Escândalo
para que você pudesse trabalhar os outros juízes do parlamento. Não mereço um
denguinho?
- Minha querida,
mereces tudo, mas esta prebenda me foi dada, tenho que retribuir-lha!
- A benzinho, o Rei
pode até perder a cabeça, mas se me queres tua, como agora, desiste vai, não é
preciso!
- Madame, farei o que
me pedes, ou não farei, mas até decidir, manterei o povo em suspense, para que
os panfletos me deem notoriedade, afinal agora sou um Ministro do Parlamento de
Paris! Vê como fiquei bonito de barba!
- Lindinho, você é o
máximo, mas não esquece do que te pedi!
- Se o Rei não mo
pedir o contrário, obedecerei, pois não posso ficar sem tua zezete!
Smacs... intensos.
E assim, começou a
Revolução, entre os lençóis dos ministros do Parlamento de Paris! O povo continuou a não entender porque assim eram escolhidos os ministros, e porque quando os pobres roubavam galinhas eram presos, mas aqueles que compravam pares, cargos e ministros eram inocentados! O povo continuou bestificado, porque os jacobinos incitavam-no à honra, à honestidade, à comuna, mas quando no poder, aplicavam as regras do terror, até aniquilar a oposição pela guilhotina, ou pelo empastelamento da imprensa! O povo, ora o povo, continuou acreditando que papai Noel e coelhinho da Páscoa existem, e ao ver o Parlamento de Paris, acreditavam que lá havia nobres togados, sabedores do direito! Pobre povo!
Uma homenagem a Nicolás
Edme Restif de La Bretonne.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sentir, Pensar, Expressar! A Intenet tornou possível a qualquer homem, a qualquer mulher, expressar tão livremente seu pensamento e seus sentimentos, quanto o são em realação ao seu existir! Eis o resultado!