Espaço de sentir e pensar de Laércio Lopes de Araujo

domingo, 25 de março de 2018

Seguido





Caminho, e neste caminho sinto uma presença,
Aqui tão próxima, premente, presente,
Olho, insisto, persisto, mas não vejo,
Do fundo de mim um medo, assombração?
Do meu pensamento, de outro mundo?
Sem que a presença ausente se desfaça!

Seguido, mas seguido não só como sensação,
Mas como pressentimento, de um iminente revelar,
De um estar sempre ali, onde nada há, ou pelo menos,
Onde nada pode ser visto pelos olhos cansados,
Pela luz que me falta, pelo entendimento limitado!

Seguido, talvez, não por um espírito qualquer,
Não por um pensamento tresloucado, paranoico,
Mas simplesmente por meus próprios fantasmas,
Pelas cruéis certezas que tenho de minhas falhas,
Pelas devastadores verdades que me afligem!

Seguido pelas fragilidades de uma alma atormentada,
Pela incerteza da permanência do sentimento que habita,
Cada coisa que faço, cada pensamento que exprimo,
Cada afago que faço, cada linha que escrevo!
E assim, “noiado”, percebo minha insanidade!

Curioso é que me sinto menos seguido no escuro,
Quanto menos luz, menos sensação tenho de outro,
Porque no labirinto sem luz que habitam meus pensamentos,
Apenas e tão somente eu poderia caminhar sem medo,
E então, não sou seguido, porque bastam meus múltiplos!

E se percebo, nalgum lugar que sou seguido,
Basta-me encarar o vulto, para vê-lo de dedo em riste,
Apontando para mim inclemente, severo, autoritário,
Antes perguntando-me o que penso, para logo a seguir,
Dizer-me que pensa ao contrário, apenas para embaralhar-me!

Então, como multidão de pensamentos, todos enfileirados,
Atropelados, sôfregos e desmesurados, perseguidos,
Permaneço a passos largos, numa marcha resoluta,
Acelerada, fatigante, em direção à falta de luz,

Na quietude do silêncio original, onde não mais serei seguido!

Olhares





Encontro na tela tantos olhares,
Tantos esgares, tantos falares,
Encontro na tela teus lábios,
Que sucumbem à angústia de um não estar,
Tão presente quanto as dores acusadas,
Em cada um dos olhares...

Olhares, tão envoltos na repulsa,
De um vômito compulsivo das dores,
Tão contorcidos na percepção das dores,
Tão enigmáticos na desconfiança desabrida,
Olhares tão esbugalhados do sofrimento!

Vejo na ânsia das cores que partem,
Do interior mais profundo de uma alma dorida,
A necessidade de buscar, com os olhares,
O olhar do outro, que sinta, reverbere,
As dores e angústias que trouxeram vida no espaço!

E nos olhares que permitem do mundo um existir,
Para além dos sofrimentos sentidos, retidos,
Torno-me de pronto existente em você,
E então, apenas então, percebo os olhos que vazios,
Sumidos de suas órbitas, acompanham-me a olhar,
Este mundo, tão estranho mundo, que habita em mim,

Para logo emoldurar este outro mundo, além de mim!

sábado, 24 de março de 2018

O Desejo



Não concordo com o missivista,
de que o desejo só pode,
ser sentido, ser possível de longe,
Porque sei que sinto diferente!

Cada parte de mim, tem de você,
o desejo mais que urgente, premente...
fosse sobre a cama de amar,
fosse a quilômetros no mundo a lamentar.

Mas sinto, na cama de amar
este desejo urgente, presente, violento,
Que me tolda o juízo, me perde...
Para logo me encontrar no ato de amar

A distância me fere, aliena de mim
O que de mim só existe em você...
Tolero cada dia menos a ausência,
Vivo intensamente a presença de existir.

Se o desejo é possível de longe?
Ele é torturante, angustiante, medo,
O desejo é sentido no toque, nos olhos,
O desejo é explosão de olfatos, sons...

Desejo é marcado pelo metrônomo do tempo,
Aumenta quanto mais me quedo em você,
E se distância se impõe, amor...
É antes tortura e penitência, nunca desejo.


Desejo! O que faço, se este se multiplica em mim cada vez que te vejo?