Espaço de sentir e pensar de Laércio Lopes de Araujo

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

O Paraíso




Olhava para a parede, um grande relógio que marcava o tempo, talvez desde tempos imemoriais, fazia o ponteiro dos segundos arrastar-se!
Estava aflito, os olhos injetados, o suor a pingar-lhe pela testa! Tinha que estar ali à espera do momento em que pudesse alcançar o desejado momento. Ansiava pela hora que a porta abrisse.
Uma porta ao lado dizia algo que para ele era incompreensível naquele momento, não conseguia sequer ter capacidade de entender o que dizia a placa sobre a porta, afixada com descuido.
O local era amplo, milhares de pessoas passavam indiferentes ao seu sofrimento. Ninguém sequer parou para perguntar-lhe por que de tanta agitação no olhar, por que sentia calor num dia que, se não estava frio, também não era um dia quente para que pudesse estar suando tanto.
Ficava imaginando a propriedade da regra de pessoas com mais de 65 anos terem a preferência em muitas situações, se a sua situação, apesar dos apenas 40 anos, era ainda mais premente, do que a de qualquer um, naquele momento, que tivesse mesmo mais de 100 anos como Niemeyer.
Avançava o relógio inexorável, mas cada vez mais angustiosamente lento. Percebeu que o tempo se elastecia, que sua vida tornava-se eterna naqueles segundos fatais. Havia já atrás de si uma fila, que sem ser grande, servia para aumentar seu desespero. Uma algaravia vária que incompreensível para ele homem, era como que natural para as mulheres, que falam todas ao mesmo tempo, e todas umas com as outras, sabe-se lá como se entendendo!
Os últimos segundos pareciam horas infindáveis, o suor pingava sobre o lábio, a língua o colhia, salgado, viscoso, como que anunciando a tragédia de uma condenação à danação eterna.
Mais um segundo!
De repente!
Abrem-se as portas do paraíso, sai uma senhora da porta que fitava com tanta ansiedade, uma senhora com algo como 70 anos, muito lentamente, carregada de sacolas e com dificuldade para passar pela porta estreita do paraíso, mas quase chorando de dor, de esperança, implora aos céus que seja breve.
Eis que surge outra senhora, com algo como outros 70 anos, lépida, fagueira, consciente de seus privilégios acumulados apenas por existir, e furando a fila infindável de mulheres se apresenta para passar à sua frente, ao que ele então brada:
Pelo amor de Deus, não sei o que está escrito na porta do banheiro dos homens que está trancada, mas se eu não entrar neste banheiro agora quem terá de chamar Deus e todos os santos para me salvarem serão as senhoras! Perdoem-me, mas o paraíso tem o tamanho e o lugar deste banheiro!
Atirou-se com um leve, mas resoluto movimento de corpo para dentro do banheiro feminino, teve mil orgasmos ao livrar-se do resultado das cervejas que havia tomado com o filho na praça de alimentação daquele espaço público. Só então percebeu, que fazer política é isto mesmo, colocar todos os homens em desespero, para que, em um segundo bendiga a presença de um banheiro público, onde possamos despejar todas as nossas más consciências. Isto se o banheiro estiver funcionando é claro!
Saiu arrumado, recebeu alguns olhares feios, outras críticas mascadas entre dentes, mas enfim, tinha salvado sua alma, e sua dignidade!
Salve o Banheiro Público!

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