Espaço de sentir e pensar de Laércio Lopes de Araujo

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Teu nome





Acordo de madrugada,
Penso em você, e lá estava você,
Presente em mim, presente em minha história,
Distantes e tão próximos,
Ausentes de nós, sofrendo pelo que somos,
Pelo que deixamos de ser...

Você não tem certeza do que é,
Eu não tenho nenhuma certeza de minha existência,
Só sei que da última vez que olhei fundo,
Bem dentro de teus olhos,
Que olhei teu corpo,
Que senti cada parte de você,
Que percebi que naquele instante me desejava,
Cheguei muito perto de encontrar,
Enfim, o motivo de existir,
De existir para te amar...

Somos apenas estranhos,
Num mundo de solitários,
Num mundo de liberdades forçadas,
Que nos aprisionam nas correntes do nada,
De um nada que se avizinha pela solidão irredutível,
De existir, sem sentido...

Mas é como se você tivesse
Surgido em mim e eu em você...
Imagino todos os seus sofrimentos,
Imagino todas as suas faltas,
Imagino todas as suas sobras,
Não consigo dizer ou imaginar,
Uma forma de dizer que as amo,
Que não poderias ser outra mulher,
Que não apenas tão e somente você!

Sua sanidade não é mais crítica do que a minha,
Somos dois loucos em busca de um sentido,
Perdidos no mundo desvairado de mentiras,
Somos dois artistas do nihilismo,
Impregnados de um amor cínico pela humanidade,
Somos dois perdidos e achados,
Um no outro, um em outro,
Sou o que me fazes,
Serei mais, o dia que fores o que te faço...

Se sabes seu nome,
Sabes quem sou, onde estou,
E onde hei de me perder...

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Toque





O toque não é encantador por aquele que toca
Mas por aquele que é tocado,
Por sua feminilidade única,
Completa,
Estupefaciente,
Bela,
Definitiva...

Quando tocar-te me faz existir,
Para além do tempo,
Para muito além de mim,
Quando minha ausência,
É fraqueza, é miséria,
É inépcia, é fatalidade...

Quando tocar-te, privilégio que me concedes,
Que não sei quanto mereço, mas que gostaria de...
Tocar-te me faz mais vivo e real,
Mais verdadeiro, mais existente,
Mais crente no que sou de bom,
De honesto e real,
Quando não te tocar me revela,
Todas minhas fragilidades, minhas insuficiências,
Meus mesquinhos preconceitos,
Minhas proteções, de minhas covardias,
De minhas egoístas memórias...

Quero-te hoje, lendo,
Representando, vivendo,
Quero-te nua, vestida, sóbria, embriagada,
Quero-te com o que te sobras, com o que te faltas,
Quero-te toda inteira, toda como és,
Quero-te como sempre será, se me amares um dia...

Toque, que só existe, na intimidade de mim e de ti,
Que só existe no espaço exíguo do tempo e do espaço,
Que vivemos na cama que elegemos como planeta,
Inteiro de nosso amar e sentir...

Quero-te...
Toque!

Sentido?






Fecho os olhos, cansado de existir sem sentido, amando, mais que amado, exausto de perceber o non sense de cada dia, de cada respirar, da frenética sucessão de dias e noites, de ruas, calçadas, faixas, sinaleiros, pedestres, rádios, sons, pássaros, nuvens, arvores, asfalto, veículos, bicicletas...
Fecho os olhos e a angustia de existir me assalta, entendo Sartre, entendo a liberdade irredutível dos seres, a solidão insofismável que nos cerca. Fecho os olhos e desespero para entender que isto é o que permeia a vida...
Impulsionado pelo desejo de manutenção da vida de uma carga genética alheia a mim, não compreendo bem a necessidade de dar sentido a esta existência vazia e repetitiva, determinada por ânsias incompreensíveis à razão e completamente alheias às minhas paixões.
Penso atribuir-me sentido para esvaziar meu sofrimento, mas a busca é vã, porque não há sentido, não há sentido possível numa vida que apenas se reproduz, que se busca repetir num incansável emaranhado de falta de sentido, de reprodução estéril, de faminta sede de liberdade.
Sim, se há algum sentido no existir é a liberdade, mas tudo me busca limitar, tudo é desonesto com meu sentir, com meu existir, tudo é mentira em volta de mim, tanto assim, que a verdade é que é coisa ruim, a verdade é falsa, abjeta, monstruosa, porque nega a existência do mundo tal qual ele é, tal como, e apenas pode, se apresentar ao todo...
Não, estamos redondamente enganados, não é a mentira que é o problema do mundo, mas a verdade, ela é insuportável, medonha, destruidora, invejosa, a mentira sim, esta é a construtora da cultura, da arte, da linguagem e da expressão da arte, mecanismo original de demonstração de amor ao mundo.
Mas, se vivemos porque o mundo é mentira, mentira não só para nós, mas para o demiurgo criador também, então em que ordem estará a verdade? Estará ela relacionada ao demônio? Acredito que sim, nada mais ruim e demoníaco do que aqueles que se acham donos e dominadores da verdade, nada mais violento e infame do que os que acreditam saber tudo de verdadeiro e único, nada mais torpe do que os fiéis invioláveis e puros.
Assim, a existência é um eterno mundo de cabeça para baixo, que se repete não como um paraíso na terra, mas como um Inferno dantesco, que se renova a cada dia, para acentuar nossa indizível mesquinhez, nossa profunda insignificância, nossa infinita desimportância.
Preciso desta reflexão, preciso disso para acomodar meu desassossego, para aplacar a dor do meu pensar, para permitir, mesmo que por algum tempo ainda, uma repetição inexplicável do mesmo, todo o tempo, do nada, toda a vida, do sem sentido a cada momento.
Sentindo, é isso, apenas sentindo todo o nada que cerca o existir, é que somos capazes de perceber que o que dá sentido à existência é sentir, sentí-la dolorosa, sentí-la torturante, sentí-la sem sentido.
Como farei para continuar a repetir-me só, livre, e ao mesmo tempo escravo deste mundo mentiroso e paradoxal que construímos à imagem e semelhança de nossa falta de sentido?