Espaço de sentir e pensar de Laércio Lopes de Araujo

terça-feira, 4 de julho de 2017

Retorno




O homem que apanhara o pedaço de jornal, numa rua qualquer, de uma cidade qualquer de um país qualquer, num impulso o guarda como tesouro em seu bolso, e segue em seu retorno para casa.
Algumas quadras mais e chega a uma pequena casa, um espaço ou um lugar no tempo, onde seus ossos, cansados e subjugados pelos anos vividos, encontravam algum repouso, merecido repouso pela vida que se estende, sem sentido, sem objeto, mas sentida plenamente em cada ato de existir.
Recolhe o molho de chaves, tantas chaves, em quantidade muito maior do que as fechaduras que ainda tem para abrir. Chaves que foram se somando, portas que foram guardando segredos, histórias, esperanças. Chaves que nunca mais foram usadas, mas que embutiam em sua presença uma esperança nunca encerrada.
Com dificuldade identifica a chave que lhe franqueia a porta de entrada, retorna, abre a passagem para um mundo que parara no tempo. Que fizera questão não sofresse transformações desnecessárias, em que se acumulavam fragmentos do mundo como pó, fragmentos de história como decomposição.
Avança pela sala, quando cruza com o espelho do banheiro social. Contempla então, com olhos de estranho, uma face enrugada, distante, alheia, irreconhecível, marcada.
Só então percebera, que quando os jornais sumiram, os livros deixaram de existir, que ninguém mais encontrava um motivo para ler seus escritos, ele mesmo passara a ser um estranho cujo desencontro, acontecia todos os dias, em cada marca que lhe acrescentava o tempo na pele que não mais sentia!

Doeu, o retorno, daquele que sumira, dentro de si mesmo, contemplado no vazio dos próprios olhos! 

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