Inexplicável entender a morte como sofrimento,
apenas uma vida vivida com a má consciência da eternidade, pode lamentar a
morte!
Somos finitos, e é esta finitude, sua
consciência que nos torna humanos. A urgência de viver, de criar, de deixar em
nosso rastro algo que se perpetue, para além de nós mesmos! Esta finitude
sagrada, porque inafastável, invencível é o que dá sentido a cada ato
praticado.
Loucos são os que buscam remédios para a morte e
para o sofrimento, porque nos desumanizam. Pior do que uma sociedade governada
por engenheiros ou advogados, seria uma sociedade governada por médicos.
São os médicos seres sádicos, que vivem do
sofrimento do outro, que se locupletam com o tormento de nossos medos mais insignificantes.
São os médicos os carrascos do prazer e da existência humana. Buscam limpar o
mundo do sofrimento, mas o mundo é sofrimento, sem o qual, não haveria
consciência da existência e do tempo!
Devemos nos revoltar contra sociedades
esterilizadas e esterilizantes, contra proibições de todos os males, porque são
os males que me dão consciência de minha humanidade, que me abrem o caminho
para uma finitude cheia de prazer, vivida na liberdade de fazer escolhas para o
meu bem e para o meu mal!
A medicina, a fisioterapia, a odontologia, a
terapia ocupacional, são ciências a serviço da perpetuação do sofrimento, do
engodo, da esterilização do mundo, transformado em um grande laboratório de loucos
e embrutecidos procurando perpetuar-se, para absolutamente nada!
Quero um mundo governado por poetas, músicos,
filósofos, de pés no chão, pouco preocupados com a cor do cabelo, com as rugas
dos olhos, com os pés cansados, as articulações grosseiras.
Quero um mundo cheio de dores e desencantos
plenamente humanos, sofridos intensamente, em cada segundo, dolorosos, mas
verdadeiros!
Quero um mundo onde eu possa lamentar a falta,
onde eu tenha de lamentar a falta, onde escutar uma música, possa ser sentido
como se fosse a última vez, e viver intensamente o prazer de escutá-la!
Quero um mundo sem UTIs, sem tomografias, um
mundo onde o cuidado seja prestado pelas mãos de outro homem, de outra mulher,
que se compadecem do meu sofrimento e são capazes de chorar comigo minhas dores,
sem me isolar num lugar tão mais triste quanto um manicômio ou um mausoléu!
A eternidade é para os deuses! Maiores que eles
somos nós que temos a consciência de nosso existir frágil e finito, e que dele
podemos tirar toda a intensidade de um tempo que se acaba a cada segundo,
responsável por cada queda, por cada esfolão, por cada dor adquirida, vivida e
mantida como patrimônio único de minha unidade como existente!
Que eu exista apenas pelo tempo da música que
toca, e oprime meu coração!
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