No dia de hoje, 24 de abril, um dos mais importantes repórteres da
FOLHA, Janio de Freitas, discute a sequência aparentemente interminável de
episódios de corrupção no Brasil. Questiona-se sobre o emendar-se de uns em
outros episódios, em uma inflação de imoralidade.
Discute-se sobre alguns aspectos políticos brasileiros, mas
restringe a questão ao mundo político. Ora, o mundo político é reflexo de nossa
sociedade, da nacionalidade que construímos. Nossa falsa moralidade é a causa
última deste descalabro.
A própria imprensa atua como mecanismo de reprodução, não só da
sensação de que há realmente um avanço da imoralidade pública, como é seletiva
nesta denúncia irrefreada, promovendo alguns órgãos como sacrossantos altares
da moralidade e em contrapartida, questionando outros sem o menor critério.
Concordo com Janio de Freitas quando diz que não é a impunidade a
causa da imoralidade e da corrupção, mas é antes um fenômeno suplementar. Diria
mais, a impunidade no Brasil é consequência da construção do Estado que
fizemos, nós e nossos antepassados e que somos incapazes de corrigir em seu
rumo.
Tenho visto muita indignação e falação sobre a corrupção. No
entanto, vejo pais esperando filhos em fila dupla na frente da escola
particular, como se aquela apropriação do espaço público fosse absolutamente
natural, normal e nada reprovável. Vejo cidadãos comprando automóveis e SUVs
cada vez maiores em nossas já saturadas ruas das cidades, invocando o direito
de ter o seu mega veículo, como prova de seu sucesso, de seu status de ocupar
espaço não de dois carros, mas de três, para poder ser visto.
Estacionamos em qualquer lugar e buscamos falar com um amigo no
serviço de trânsito, se por azar, um agente tiver a insensatez de multar-nos,
nós que somos amigos, filhos, parentes ou conhecidos de qualquer autoridade
pública.
Apropriamo-nos de maneira indecente da coisa pública, mas
julgamos imoral quando o outro o faz! Agora, é bonito e absolutamente correto
falar mal do Carlinhos Cachoeira, para muitos a própria encarnação do demônio,
ainda mais com sua relação incestuosa com o poder via Demóstenes Torres o anjo
caído.
Ora, só existem Carlinhos Cachoeira, porque hipocritamente proibimos
todo o tipo de jogo de azar conduzido pela iniciativa privada. Por quê? Por uma
única e simples razão, devemos criar dificuldades para vender facilidades.
Precisamos de mais policiais, de mais fiscais, de mais promotores, ou seja, o
Estado se reproduz, criando falsos moralismos, dificuldades incoerentes e
contrárias ao desejo humano.
Não gosto de jogos de azar, não aposto nada em jogos, mas acredito:
uma coisa absolutamente sem sentido é proibir tais jogos porque inerentes a um
dos aspectos mais importantes do macaco glabro que somos, nossa necessidade
lúdica de jogar, todo o tempo. Assim, proibir jogos é permiti-los sob condições
inconfessáveis.
Assim como todo discurso sobre a necessidade de controle sobre a
mídia. Ela nasce cheia de boas intenções, cria a necessidade de um imenso e
esclarecido grupo de profissionais técnicos a serviços do Estado, que
necessitarão de um imenso aparato para poder desenvolver as suas atividades de
maneira competente, e por fim, sai muito mais caro impedir que se tenham
publicações absolutamente indecentes, do que termos que educar para que as
pessoas não as leiam e firam de morte tudo que for de mau gosto!
Carlinhos Cachoeira é inocente! Mais inocente ainda é o pobre,
tímido e abobalhado Demóstenes Torres! São inocentes sim, eles são apenas o
resultado da necessidade de cumprir com o desiderato da lei que proíbe os jogos
de azar, que é o de tornar a exploração deles clandestina, fazendo assim com
que haja corrupção política, social e policial, com a multiplicação de leis, de
penas, de discursos inflamados, de número de policiais e de consciências
hipócritas.
Como diz Janio este “colar de episódios escabrosos” vai parar
quando houver na mídia e na sociedade a necessidade de parar de falar de
corrupção e aparecer outra necessidade, nem mais nobre, nem mais ética, nem
mais valiosa, apenas mais rendosa para a venda de jornais e para o
enaltecimento das falsas consciências.
Outro subproduto deste mar de lama fabricado e desejado, é que em
breve teremos um cansaço intenso com a discussão da corrupção, e ao final
teremos um punhado de frágeis políticos derrotados, abrasados e afastados do
convívio social, mas Sarney, Calheiros, Barbalho e outros permanecerão fazendo
o que sempre fizeram sem oposição, porque blindados pelo efetivo poder que interessa
as imensas redes de clientelismo.
Mas também não há que bradar e vociferar contra o clientelismo,
ele faz parte de nossa sociedade, da construção do nosso povo enquanto
identidade. Costuma-se dizer sem nenhum fundamento que o nosso problema é que
só veio para o Brasil a escória da sociedade portuguesa, os degredados.
Mas vamos ser honestos, não vieram para o Brasil a elite da
sociedade alemã, polonesa, italiana, russa, francesa, inglesa e japonesa. Quem
veio ao Brasil veio porque passava fome em seus países, porque não tinha
perspectivas sociais ou econômicas, não eram desejáveis em suas próprias
sociedades, mas eram sim, parte da massa de indesejáveis que todas as
civilizações em crise põem em movimento para diminuir a necessidade de dividir
o bolo. Nosso país recebeu-os a todos, de braços abertos, mas por óbvio um dos
mecanismos necessários de proteção de comunidades desenraizadas social e
culturalmente é o desenvolvimento de intensos laços de dependência. Ora, daí o
surgimento de nosso clientelismo social e político!
Outro aspecto que não pode ser esquecido, rimos de nossa história,
ridicularizamos os nossos governantes do passado e das nossas instituições.
Como podemos respeitar nossos políticos e nossas instituições se somos
incapazes de tecer um juízo histórico positivo e crítico sobre elas? Com
certeza ao olharmos para os Estados Unidos temos forçosamente que lembrar os
escritos de Alexis de Tocqueville. Mais do que isso, observar que os americanos
têm um agudo sentido de democracia, república e de respeito e amor pelas suas
tradições!
Quantos de nós sabemos muito sobre a guerra de independência dos
Estados Unidos, mas acredita que nossa independência foi proclamada por um
príncipe genioso ao largo de um riacho inexpressivo chamado Ipiranga, e pronto,
estava feito o Brasil?
Bom, e como questão última de reflexão fica colocada uma
discussão! Corrupção, que vem de corromper, é um desvio, é um não estar
conforme, o que pressupõe que exista uma norma, uma conduta correta e valorada.
Onde tudo parece ser corrupção, vale a pergunta, em relação a que valores? Em
relação a que sociedade? Em relação a que regras morais?
Não acho nosso país mais ou menos corrupto que os outros, o que
somos é muito bestas, somos os mais falsos moralistas cidadãos do planeta,
fingimos uma consciência política que não é nossa, e a aplicamos sempre que
necessário, por motivos que jamais seriam expostos à luz do dia. Elegemos deputados
e senadores para nos dar bem, depois que eles se dão bem e nos ajudam com
migalhas, então ao serem pegos, no que fazem por ordem natural das coisas numa
sociedade apolítica, então elevamos nossa voz com a indignação geral.
Por favor, não há nada mais imoral, inconstitucional e indecente
do que a Lei da Ficha Limpa! Uma democracia em que vão se construindo barreiras
a quem pode ser eleito só pode estar sofrendo de esquizofrenia, ou porque
consideramos os eleitores incapazes de votar criticamente e com consciência
política ou porque somos incapazes de amadurecer o regime republicano e
democrático, tendo de construir mais normas e penas, mais leis, mais órgãos
fiscalizadores e, portanto, mais impostos, mais proibições, mais poderes em mão
de poucos, e obviamente, inapelavelmente, mais corrupção!
Que sociedade queremos? Vamos deixar o povo votar! Temos medo?
Vamos parar de passar de bons moços, não há corrupção no Brasil, apenas um
bando de aproveitadores que gostam de explorar na mídia fatos absolutamente
conformes com a consciência nacional, buscando ganhos não tanto publicáveis! Daí
senhores, quem são os corruptos?
Não esqueçamos, onde há um corrupto, há um corruptor, onde há
ambos existe uma sociedade e uma imprensa que busca dar-se bem!
Estou começando a gostar do Lula, ele dizia nunca saber de nada,
por isso o povo o adora! Realmente não sabia, por quê? Porque saber é desnudar
o óbvio, porque saber é ter de fingir que se acredita no oposto do que se faz,
e é por isso que ele é um genial animal político, muito mais parecido com o
povo brasileiro do que qualquer outro político de nossa história!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sentir, Pensar, Expressar! A Intenet tornou possível a qualquer homem, a qualquer mulher, expressar tão livremente seu pensamento e seus sentimentos, quanto o são em realação ao seu existir! Eis o resultado!